Como Montar Corretamente Ferramentas no Slitter
Publicado em 17 de set. de 2016
É comum encontrarmos nas indústrias de transformação de bobinas Linhas de Corte Longitudinais (slitters), que possuem programas para montagem do ferramental que nunca — ou quase nunca — são utilizados. Isso costuma ocorrer principalmente nas fábricas de tubos, nas quais acabam se perdendo na evolução dos equipamentos de informática e seus respectivos sistemas operacionais, ou mesmo devido à rotatividade dos funcionários. Em outras palavras, acaba prevalecendo a experiência do operador de slitter e seu processo manual de montagem.
Nas empresas em que não há uma prática de montagem de ferramental via software, um ou mais dos seguintes sintomas sempre está presente:
- O tempo de setup é superior a 30 minutos, mesmo com cabeçote para troca rápida e equipe completa.
- Só se consegue fazer quatro ou cinco setups em um turno de trabalho.
- A frequência de envio do jogo de facas/expulsadores para retífica é alta.
- Ocorrem quebras frequentes no ferramental.
- Não raro, os responsáveis pelo processo seguinte reclamam que a chapa está com “problema”.
- Ocasionalmente, aparecem rolos pequenos no processo, pois o operador teve que dividir a bobina.
Essa prática manual afeta a produtividade, a qualidade do produto e, principalmente, põe em risco o ferramental. Repito o que um experiente gestor me disse uma vez: “Existem dois tipos de empresa: a que acredita no software de montagem e a que não acredita.”
Para que serve um software de montagem?
Quando o equipamento foi comprado, principalmente os da década de 1990 para cá, sejam nacionais ou importados, sempre se ofereciam os softwares de montagem junto com o jogo de ferramental novo. Sua indicação pelos fabricantes não era apenas para dar um “ar de sofisticação” ao produto, nem para agregar-lhe valor. O intuito foi sempre garantir a qualidade dos itens fornecidos, preservando o bom nome dos fornecedores de ferramental, pois estes sabem o estrago que pode ocorrer numa montagem mal feita.
O software de montagem serve para que o operador monte de forma rápida e segura o ferramental do slitter, que basicamente compreende:
- Jogo de facas, distanciadores e expulsadores no cabeçote de corte.
- Jogo de discos e calços separadores das fitas cortadas nos eixos de separadores.


Como é feita a montagem manual?
O operador experiente sabe que, dependendo do aço, ele tem que aplicar uma folga de corte adequada. E sabe, ainda, que aço não é tudo igual. Entretanto, na montagem manual, considerando os ajustes e a medições inadequadas (paquímetro em “pacote” de calços, sem a devida compressão) ele atribui uma folga “adequada” para a espessura e o aço, em função da facilidade da montagem.
O operador “responsável”, que faz a montagem sem o software, coloca o ferramental no eixo (facas, distanciadores e expulsadores) e, ao final, aperta a porca hidráulica. Ele entra entre o Guia de Entrada e o Cabeçote de Corte, acende a luz sobre o cabeçote do lado oposto, e pede para girar o motor em manual. Daí, ele percorre com os olhos todo o eixo, para ver se há risco de uma faca bater na outra. Estando tudo “seguro”, ele dá mais um aperto na porca hidráulica de fixação do ferramental e passa a operar em “automático”.
Se houver alguma folga “apertada”, com risco de uma faca bater na outra, o operador pega um calço (shim — muitas vezes quebrado para entrar no eixo sem ter que tirar tudo da frente) e, com ele, aumenta a folga entre a faca superior e inferior. Ocorre uma variação das folgas a cada fita, frequentemente resultando em “cortes apertados” ou “rebarbas excessivas”, além de um desgaste prematuro das facas.
O que se ganha na montagem com software?
- Velocidade na montagem — Tendo o equipamento em condições e pessoal treinado, o uso de software para montagem das facas reduz o tempo da parada, uma vez que o operador não tem que fazer contas e ficar escolhendo os calços e medindo-os constantemente com paquímetro. Sem o software de montagem, mesmo o operador experiente não guarda na memória todos os calços utilizados no setup anterior (que está operando), bem como os disponíveis para a próxima montagem (que ele está fazendo). Então, ele fica na “tentativa e erro”.
- Qualidade do corte — Um bom software de montagem traz as folgas de corte necessárias que o operador aplica sabendo dos materiais que vai processar (tipo de aço e espessura). O software busca os calços adequados para uma montagem segura que tenha, em todas as fitas, a mesma folga. Assim, não há risco de o corte ficar de boa qualidade de um lado e ruim do outro.
- Segurança na montagem — Com o uso do software, elimina-se a dependência do operador em sua inspeção após montagem. Frequentemente, vejo operadores pararem o corte no meio e refazer a montagem, gerando além de perda de tempo, sucatas não previstas. Além disso, não há dependência da acuidade visual do operador (aliás, quando foi a última vez que seu operador fez exame de acuidade visual?). Se ele utiliza um software adequado e faz tudo certo, é só apertar os eixos adequadamente após a montagem e rodar a máquina.
Condições que impedem a montagem com software
Dissemos aí atrás neste artigo que existem dois tipos de empresa, as que acreditam no software de montagem e as não acreditam nele. É fato comprovado que as primeiras produzem 40% a 50% mais que o outro tipo de empresa, com os mesmos recursos. Mas não é só por vontade que as pessoas relutam em utilizar esse recurso. Alguns fatores as impedem ou até inviabilizam o uso de software de montagem. Vejamos as condições necessárias para operação e uso de softwares de montagem:
Eixos de trabalho em condições inadequadas
Os eixos da tesoura são como “portas-ferramentas” de usinagem, e transmitem às facas e distanciadores todos os seus problemas e imperfeições. A principal delas é o empenamento. Caso haja uma variação superior a apenas alguns centésimos de milímetro por metro de eixo, isso já é um problema, que vai representar ora uma redução que pode até fazer chocar uma faca com outra, ora um aumento da folga, gerando rebarbas e, não raro, falta de corte.
Não vamos especular o que gera esse empenamento dos eixos aqui, mas a operação constante com eixos empenados vira uma bola de neve: É comum que não se consiga cortar as fitas no meio do eixo, induzindo o operador a dar mais pressão de corte, o que aumenta ainda mais a flexão do eixo durante a operação, podendo gerar consequências negativas tanto para o material quanto para o próprio equipamento.
Não adianta ter facas com precisão milesimal se o eixo não tem nem centesimal! O mesmo vale para o desgaste excessivo do diâmetro, que pode afetar o ajuste da folga vertical e comprometer a qualidade do corte, gerando rebarbas e outros defeitos de corte.
Eixo empenado
Sistema de fixação das facas ineficiente
A fixação do ferramental no eixo de trabalho é fundamental para se garantir as folgas requeridas e a estabilidade do corte. É preciso ficar atento ao uso adequado de “porcas de bater” e das porcas hidráulicas, bem como para outros sistemas de aperto. Reforçando, um cuidado especial deve ser dado às porcas hidráulicas, notadamente no que diz repeito ao uso da graxa correta, bem como da pressão indicada pelo fabricante da máquina, que é essencial para uma boa fixação do ferramental.
Imagine o leitor se, depois de tudo ajustado, o sistema de fixação se abre, gerando folgas de corte inadequadas durante a operação automática. Mesmo que sejam alguns centésimos, as consequências são graves.
Cabeçotes de corte com folgas ou desajustados
Outros pontos de verificação importantes são os mancais da tesoura. Normalmente ajustados por sistema tipo excêntrico de posicionamento e sincronização, ele deve estar paralelo e com folgas dentro do recomendado.
Do mesmo modo que o empenamento, um eixo inclinado tende a alterar as folgas, além de desgastar o gume de corte das facas prematuramente. Imagine que quando há uma inclinação no eixo, um dos seus lados tem que entrar mais na chapa, a fim de que o outro lado consiga cortar. As facas costumam apresentar desgaste lateral excessivo e as quebras são comuns, além do que as tiras cortadas apresentam acabamentos diferentes umas das outras numa mesma montagem.
Inclinação no Eixo
Jogo de ferramental incompleto
Considero que este seja um dos grandes inimigos da padronização e do abandono do uso de software para montagem de ferramental nas indústrias. É lógico que quando foi instalado o equipamento novo, com ferramental completo, tudo corria como planejado.
Com o tempo, facas quebraram, expulsadores foram gastos e alguns calços distanciadores finos (de folga) foram até quebrados propositalmente pelo operador. Se existem equipamentos compartilhando o mesmo jogo de ferramental, então, não há o que fazer, a não ser ficar na tentativa e erro…
Jogo mal especificado
Jogos de ferramental mal dimensionados também são um grave problema. Cabe ao fornecedor questionar o uso adequado e especificar alguns parâmetros básicos, para que se tenha a quantidade e qualidade adequada de facas, expulsadores e calços distanciadores para o equipamento do cliente. Se um software é desenvolvido para fazer no máximo 20 cortes, é bem provável que quando se tenta fazer 22 ele vá falhar.
Muitas vezes o operador nem sabe que o equipamento é limitado, ou mesmo que o aço que está utilizando tem propriedades diferentes do usual, requerendo outras folgas e apertos, sendo que isso foi considerado no software de montagem. Os dados informados pelo próprio cliente, bem como outros obtidos junto ao fornecedor do equipamento devem ser respeitados também no chão de fábrica.
Cabe lembrar que ao especificar um jogo de ferramental, os calços distanciadores de precisão têm quantidades dimensionadas para que a propagação do erro não afete a precisão final do corte. Não é raro um fornecedor de ferramental ofertar um jogo mais “enxuto” e, consequentemente, mais barato. Só que isso pode causar uma perda de precisão e colocar em risco a vida do ferramental.
Operador sabe-tudo
Temos que respeitar o conhecimento dos operadores. Mas existem aqueles que acham que não erram, por terem anos de casa e a confiança dos sócios. Apesar da autoconfiança elevada, eles temem perder o emprego se um software conseguir fazer o que ele levou anos “ralando” para aprender. Então ele culpa o ferramental desgastado, a falta de peças, as condições precárias do equipamento, e até a falta de equipe para que tudo continue como está. Isto é, nada de melhorias, pois seus erros vão aparecer se não tiver quem culpar…
Falta de Treinamento
É claro que tudo o que foi dito até agora é de conhecimento dos gestores. Sabemos também que as empresas estão em constante busca de melhorias e as reduções de custos são incessantes. Porém, é preciso investir em seus próprios recursos (inclusive nos funcionários), para garantir ao menos a continuidade da operação.
Treinamentos em Operação de Slitter ou similares tendem a melhorar os conhecimentos dos funcionários e manutencionistas, além de estabelecer conceitos básicos e incentivar a operação correta dos equipamentos e ferramentais e software de montagem. Assim, em curto prazo se colhem os resultados, por meio do aumento de produtividade, bem como da redução de perdas e de custos.